Boi-Bumbá: Histórioa, Memória e Cultura do Estado do Amazonas

 A emblemática história do boi de verdade que virou bumbá na cidade de Japurá-Am


Seu Manoel André (in memoriam) e dona Darcy Alves no Japurá


No estado do Amazonas existem centenas e centenas de bois-bumbás. É uma manifestação folclórica tipicamente amazônica. Mas o boi de pano, enquanto inventividade popular, não é privilégio apenas dos amazonenses.  Outros estados da região, como o Pará e o Rondônia, também possuem o folguedo em seus cenários culturais. Contudo, foi no estado do Amazonas que a brincadeira de boi tomou uma proporção extremamente espetacular, a partir da criação do festival folclórico de Parintins, a 460 km de Manaus, no ano de 1965. Vários outros festivais foram surgindo no interior do estado, depois da criação e organização do festival folclórico do Amazonas, em Manaus. 

Em 1957, o evento manauara seria fundado,  e assim, balizaria o modelo à criação de vários e vários outros que surgiriam posteriormente nas cidade do interior como em: Tefé (1962), Parintins (1965) e em Coari (1972). Em cada cidade o surgimento do festival teve sempre seus motivos e razões cruciais. Apesar do modelo maior vir da capital, as cidades do interior caminharam por outras vias como forma de construir seu próprio festival. Independentemente, dos motivos ou razões, dessas festas folclóricas, o boi-bumbá sempre se fez presente em todas, desde o início! Começando por Manaus, o motivo da fundação de seu festival foi um embate terrível entre  dois grandes e antigos bois de pano, Corre-Campo, fundado em 1942 (na Cachoeirinha), e o Mina de Ouro, de 1922 (no Boulevard Álvaro Maia). Por causa de uma briga de rua, muito séria, o município teve que moralizar os grupos e, para isso, em junho daquele ano de 1957, surgiria o I festival folclórico, não só ao estado do Amazonas, mas à Amazônia. 



O boi-bumbá Viramundo da cidade de Japurá-Am se apresentando ao público na cidade durante comemoração do aniversário do município, realizado em abril de 2022. Ele foi de verdade, de carne e osso, porém, é um boi que eterniza homenagem póstuma ao patriarca da família Alves Barbosa da cidade (seu Manoel André Alves).



Em 1962, três anos antes de Parintins, após participar do festival de Manaus, com suas famosas danças da Ciranda e do Cacetinho, foi a vez da cidade de Tefé (662 km de Manaus) fundar a sua festa. E, novamente, a figura de bumbás se fariam presentes com Virmaundo e Boijitinho.  O festival de Tefé teve o apoio dos padres espiritanos a sua primeira realização. Em Parintins, o grupo de jovens religiosos, Juventude Alegre Católica (JAC), resolveu criar o evento para angariar fundos à construção da torre da catedral de Nossa Senhora do Carmo. Foi desse modo que o Garantido e o Caprichoso ganhariam notoriedade pela primeira vez. Os clássicos Bumbás de Parintins doaram suas apresentações a Nossa Senhora do Carmo. Na cidade de Coari, o festival foi de iniciativa dos professores da Escola Estadual Nossa Senhora do Pérpetuo Socorro, com posterior apoio municipal. E novamente, dois bumbás  marcavam presença no evento, o Prata Fina de seu Ioiô (Benedito Nogueira) e um outro, chamado Estrelinha. Os bumbás sempre estrelaram brilhantemente nesses festivais. 


Grupo de primeiras brincantes do boi-bumbá Viramundo do Japurá-Am


Entretanto, a história da criação de cada um daqueles, não se compara com a do Boi-Bumbá Viramundo, na cidade de Japurá-Am, localizada no distante e alto rio Japurá ou Yapurá (a 743 km de Manaus). Em 1982, segundo relatos do professor Prado Coelho, na cidade de Japurá, é fundado o seu I festival folclórico, e o mesmo teria posto o boi-bumbá Gitinho como uma das grandes estrelas da festa. Porém, em 2010, surge na cidade um novo expoente para fazer parte do seu cenário folclórico, o boi-bumbá Viramundo - do seu  Manoel André Barbosa. Porém, o boi do seu Manoel André tem uma característica peculiar, não era de pano era de carne e osso, de verdade. Foi criado nos campos de Acanauí (distrito de Japurá) até que um dia, morreu... Era um xodó da fazendinha. E seu Manoel André, desde 2006 também já tinha partido para o campo estrelado do firmamento. Todavia, seus netos e bisnetos, resolveram homenagear ao avô e construir um boi, de cor marrom-escuro, para lembrar sempre da figura do velho seringueiro. A viúva de seu Manoel André, dona Darcy Alves (com 85 anos de idade), ainda permanece vendo e assistindo o boi Viramundo brincar nas noites mais animadas das temporadas de boi-bumbá, organizadas na cidade. Seu Manoel André foi seringueiro, mateiro, pescador, agricultor, foi tudo que um homem da floresta o é. Por todo o seu esforço e dedicação aos filhos e netos, ganhou postumamente, a eternização de seu boi de estimação, e seu nome permanece sendo repetido, a cada momento que o Viramundo entra na arena para fazer o olhar do público se alegrar. 



O pajé do boi-bumbá Viramundo de Japurá - Lázaro Damasceno Neto (Neto cedeu as fotos do artigo). É neto direto de seu Manoel André.

 Essa história é rara. A oralidade histórica e tradições do estado narram que os bois de pano e seus criadores sempre andaram juntos, em vida, ou foram consequência de alguma promessa de santo... Mas, em Japurá, o boi de seu Manoel André veio depois, muito depois de sua ida...É um boi muito especial. É de família, de memória e história caboclas. Carrega as cores azul e branco...



Epílogo

Seu Manoel André Barbosa faleceu no dia de Santa Rita de Cássia,  22 de maio de 2006. Em 2010, os netos, comovidos pelas histórias e saudades da infância,  vividas todas na fazendinha do avô, resolveram ressuscitar o velho Viramundo dos pastos e campos do Acanauí (distrito rural do município de Japurá), o fizeram como o era: marrom, garboso, charmoso, como um eterno boi de pano. E assim, o avô nunca será mais esquecido. ..

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